Antigamente era mais fácil?
Então o que é envelhecer?
Na minha cabeça, envelhecer é "não saber". Envelhecer é pensar que "é muita informação", que "o mundo mudou", que "no meu tempo era mais fácil."
Não...no seu tempo não era mais fácil. Era tudo muito mais difícil. Tudo o que você precisava, você tinha que sair para comprar. Seu carro andava menos, com mais barulho, gastando mais combustível -- e combustível caro --, seu dinheiro era mais difícil de ganhar e valia menos, e se você batesse o carro no caminho, precisava de uma ficha telefônica para avisar a alguém. Ah...claro...se a apólice de seguro não estivesse com você, não tinha como localizar as suas informações para saber se era possível mandar o guincho. Era tudo mais difícil e a gente sobreviveu. Se você ficasse doente não pagava contas; hoje você faz tudo na internet e só vai ao banco se quiser. Sem celular, sem computador, sem internet, sem delivery, sem cartões magnéticos, sem comunicação. A gente se falava por tambor, lembra?
- Telefonista, eu queria uma ligação para o Rio de Janeiro, o número é xx-xxxx.
- Pois não. Assim que eu completar a ligação eu retorno para a senhora.
Ha! E a gente sobreviveu.
As fitas k-7 enrolavam no toca-fitas, os vídeos k-7 tinham só uma cabeça, o cinema era caro pra burro, a locadora só faltava pedir avalista, telefone era um bem caríssimo que alguns até alugavam, tudo demorava muito, tudo tinha muito papel para preencher e muitos lugares diferentes para entregar. Os alimentos não tinham prazo de validade, não existia nada longa- vida, nada congelado, nada que facilitasse alguma coisa, os carros não tinham cinto de segurança, air bag, CD player, computador de bordo, e GPS era coisa de filme futurista.
E a gente sobreviveu.
Antigamente era mais fácil? A minha irmã Pat conclui: "Mais fácil porque se a mulher não quisesse pensar não precisava. Hoje ela não tem desculpa." E eu nem tinha pensado por esse ângulo. Sábia conclusão!
Era difícil demais. A gente morria de saudade de quem estava longe; hoje a gente fala com todo mundo em tempo real. A gente morria de preocupação com os filhos e com os pais, hoje a gente manda uma mensagem pelo celular e eles respondem na hora. A gente compra uma passagem barata para alguém que está há 500 km sem precisar ir até a agência de turismo, mandar um PTA que não chega e ainda correr o risco de ter alguém na mesma poltrona. Antigamente era mais fácil? E a "ordem de pagamento"? Jesuzinho...que trabalheira!
A vida está mais fácil e todo mundo tem mais tempo para outras coisas, mas existe a mania chata de reclamar da correria da vida. Sempre foi uma correria! Eu não lembro de ver meus pais não correrem. Não lembro de não correr. Viver sempre foi uma correria, só que antes com serviços lamentáveis. Hoje você corre, mas a locadora já entregou seus filmes em casa, você corre mas consegue falar com as pessoas no caminho, você corre mas o jantar está encaminhado, você corre mas lê seus e-mails no telefone e tem sempre alguém pra te entregar uma pizza.
Por isso tudo, cada vez que eu escuto alguém dizer que não se dá bem com computador porque é coisa de gente maluca; que internet "é demais para a minha cabeça", que "meu celular só precisa falar porque eu não entendo tanto botãozinho", "eu não tenho TV a cabo porque só passa porcaria", eu tenho muita pena. Tenho pena de cérebros estagnados. Tenho pena de quem vê o trem passando e acha que na estação está melhor.
E eu falei tudo isso só para contar o quanto eu estou orgulhosa da minha mãe. Há um mês ela iniciou uma batalha incrível contra um computador e está fazendo progressos. Aos 78 anos, sendo que seu último contato com a tecnologia foi um telégrafo e uma máquina elétrica de datilografia, ela resolveu que vai dominar aquela máquina dos infernos, e está quase lá. Já entra na internet, fala no msn, lê seus e-mails e descobriu as pastas de foto que eu deixei no computador sem avisar.
Eu acho que isso é se recusar a envelhecer. Não estou falando de rugas, de marcas, de aparência. Estou falando em participar do mundo onde se vive. Com tanta gente da minha idade admitindo que "é muito para a minha cabeça", eu só posso me orgulhar de Dona Marília.
Tenho dito.
Agradecimento especial a Pat Zanicotti que colaborou com o texto sem saber. :)
Na minha cabeça, envelhecer é "não saber". Envelhecer é pensar que "é muita informação", que "o mundo mudou", que "no meu tempo era mais fácil."
Não...no seu tempo não era mais fácil. Era tudo muito mais difícil. Tudo o que você precisava, você tinha que sair para comprar. Seu carro andava menos, com mais barulho, gastando mais combustível -- e combustível caro --, seu dinheiro era mais difícil de ganhar e valia menos, e se você batesse o carro no caminho, precisava de uma ficha telefônica para avisar a alguém. Ah...claro...se a apólice de seguro não estivesse com você, não tinha como localizar as suas informações para saber se era possível mandar o guincho. Era tudo mais difícil e a gente sobreviveu. Se você ficasse doente não pagava contas; hoje você faz tudo na internet e só vai ao banco se quiser. Sem celular, sem computador, sem internet, sem delivery, sem cartões magnéticos, sem comunicação. A gente se falava por tambor, lembra?
- Telefonista, eu queria uma ligação para o Rio de Janeiro, o número é xx-xxxx.
- Pois não. Assim que eu completar a ligação eu retorno para a senhora.
Ha! E a gente sobreviveu.
As fitas k-7 enrolavam no toca-fitas, os vídeos k-7 tinham só uma cabeça, o cinema era caro pra burro, a locadora só faltava pedir avalista, telefone era um bem caríssimo que alguns até alugavam, tudo demorava muito, tudo tinha muito papel para preencher e muitos lugares diferentes para entregar. Os alimentos não tinham prazo de validade, não existia nada longa- vida, nada congelado, nada que facilitasse alguma coisa, os carros não tinham cinto de segurança, air bag, CD player, computador de bordo, e GPS era coisa de filme futurista.
E a gente sobreviveu.
Antigamente era mais fácil? A minha irmã Pat conclui: "Mais fácil porque se a mulher não quisesse pensar não precisava. Hoje ela não tem desculpa." E eu nem tinha pensado por esse ângulo. Sábia conclusão!
Era difícil demais. A gente morria de saudade de quem estava longe; hoje a gente fala com todo mundo em tempo real. A gente morria de preocupação com os filhos e com os pais, hoje a gente manda uma mensagem pelo celular e eles respondem na hora. A gente compra uma passagem barata para alguém que está há 500 km sem precisar ir até a agência de turismo, mandar um PTA que não chega e ainda correr o risco de ter alguém na mesma poltrona. Antigamente era mais fácil? E a "ordem de pagamento"? Jesuzinho...que trabalheira!
A vida está mais fácil e todo mundo tem mais tempo para outras coisas, mas existe a mania chata de reclamar da correria da vida. Sempre foi uma correria! Eu não lembro de ver meus pais não correrem. Não lembro de não correr. Viver sempre foi uma correria, só que antes com serviços lamentáveis. Hoje você corre, mas a locadora já entregou seus filmes em casa, você corre mas consegue falar com as pessoas no caminho, você corre mas o jantar está encaminhado, você corre mas lê seus e-mails no telefone e tem sempre alguém pra te entregar uma pizza.
Por isso tudo, cada vez que eu escuto alguém dizer que não se dá bem com computador porque é coisa de gente maluca; que internet "é demais para a minha cabeça", que "meu celular só precisa falar porque eu não entendo tanto botãozinho", "eu não tenho TV a cabo porque só passa porcaria", eu tenho muita pena. Tenho pena de cérebros estagnados. Tenho pena de quem vê o trem passando e acha que na estação está melhor.
E eu falei tudo isso só para contar o quanto eu estou orgulhosa da minha mãe. Há um mês ela iniciou uma batalha incrível contra um computador e está fazendo progressos. Aos 78 anos, sendo que seu último contato com a tecnologia foi um telégrafo e uma máquina elétrica de datilografia, ela resolveu que vai dominar aquela máquina dos infernos, e está quase lá. Já entra na internet, fala no msn, lê seus e-mails e descobriu as pastas de foto que eu deixei no computador sem avisar.
Eu acho que isso é se recusar a envelhecer. Não estou falando de rugas, de marcas, de aparência. Estou falando em participar do mundo onde se vive. Com tanta gente da minha idade admitindo que "é muito para a minha cabeça", eu só posso me orgulhar de Dona Marília.
Tenho dito.
Agradecimento especial a Pat Zanicotti que colaborou com o texto sem saber. :)
4 Comentários:
olha! eu ja acho AGORA tudo mais facil que a ha cinco anos atras! imagina daqui a vinte!
Besitos
E parafraseando a Alice, eu já acho tudo mais fácil do que há quinze minutos atras! Embora lá pegar este trem, sô!!!
Bjcas
Pois é, só vc para me lembrar que telefonista completava ligações...
Enfim, envelhecer é ter essas passagens vividas, é ter participado de momentos que ficaram na história ou em nossa memória um tanto já falha. É estar presente no agora e, totalmente sem pressa, ir descobrindo o novo que há de vir.
Até quando? Até o momento em que desligarem a tomada; o que não será nossa culpa.
Bjos
Pára tudo!!!
78?
Dona Marília tá muito bem mesmo.
Eu sou daquelas que só fica esperando que mais vem por aí.
bjsss
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