Segunda-feira, Abril 02, 2007

Delírio - Primeira parte

Mercedes Gameiro

Os dois sóis nasceram na hora exata em que o mestre disse que aconteceria.
Era assim todos os dias em Delírio. As coisas aconteciam exatamente na hora que o Mestre dos Chifres Dourados ditava a ordem: hora dos sóis nascerem. Hora dos sóis apagarem. Hora dos pássaros de luz fazerem o espetáculo sobre a ilha. Hora de todos os seres começarem o dia de acordo com o dia da semana – Preguidei, aguadei, lavordei, paixodei, sixtday, partidei e nassingdei.
Cada dia era dia de algo importante se o Mestre assim quisesse.
Os sóis de Delírio entravam cada um por uma janela da choupana escondida onde morava Drímer Redinclauds. Já era mais do que hora de levantar e seguir os sinais sagrados até a mata, mas ela pensava em desobedecer às regras nesse Aguadei do mês dos Sóis Opostos: Dia quente, bom para sonhar. “Por que Delírio não tem um dia para sonhar?” Pensou olhando para a caixa de sonhos que conseguiu roubar do Mestre: o grande “Istóriquétier”
Sonhar era um dos três pecados capitais segundo as escrituras sagradas da Ilha. E Drímer, a pecadora mais bela.
Toda vez que sua caixa se abria, uma nova história era projetada no teto azul da choupana. Drímer passava noites e noites viajando através do teto ilustrado por contos, sentimentos e aventuras mágicas. “Por que o Mestre nos priva do sonho, se ele mesmo os coleciona?”
Questionar era outro dos três pecados capitais, segundo as escrituras sagradas da Ilha.

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